domingo, 28 de junho de 2009

Personagens - O Fim do Pequeno Notável

Por Gabriel Rocha Gaspar


Foto: Associated Press


" 'Jackie é o vocalista', determinou o pai, Joe, depois de muito custo. Desde que encontrara um violão escondido no porão do sobrado em que morava, em Gary, Indiana, passara a vigiar os filhos de perto. Ele próprio se aventurara pelas cordas (e estradas) ressonantes do blues e temia que os filhos embarcassem na onda musical. Um dia voltou mais cedo da siderúrgica em que trabalhava e colou o ouvido na porta, tentando flagrar um acorde ou outro.




Ouviu as belas vozes de Tito, Jackie e Jermaine harmonizando sucessos de Sam Cooke, Ray Charles e James Brown. Era soul, era hip, era novo, era diferente. Era grana no bolso, certeza. Sorriu, pensativo. Até que uma nota saiu do lugar e seu ouvido de músico flagrou a falha. Invadiu o porão de cinto em riste e proferiu um discurso que marcou a cabeça (e a pele) dos três moleques. "Se vocês vão fazer música, vão fazer bem feita. Nem que eu tenha que passar dez dias seguidos com vocês nesse porão". A brincadeira de criança virou trabalho profissional; os côveres despretensiosos, música pra parada de sucesso.




A contragosto do rabugento Joe, os caçulas Michael e Marlon resolveram pegar na percussão e entrar na onda. O Jackson Family virou Jackson Five. E o Jackson Five voou alto: partiu dos clubes black de Gary para os clubes black de todo o estado; de Indiana para Chicago; de Chicago para as concorridíssimas audiências da Motown. O primeiro teste não foi grande coisa, os "capos" da gravadora sacaram potencial no menorzinho. E só. Joe ficou inconformado e resolveu tirar a ideia de que 'Jackie é o vocalista' da cabeça. 'O menorzinho é o vocalista', determinou. Pobre Michael. Debaixo de porrada, ele aguentou o fardo de toda a família. Cantou, apanhou, dançou, apanhou, deixou de dormir para ensaiar, apanhou, deixou de brincar para ensaiar, apanhou, liderou o grupo na derradeira audiência da Motown, com uma versão estrondosa de 'I Got The Feelin'', de James Brown, apanhou, conseguiu o contrato, apanhou, atingiu o primeiro lugar da Billboard, apanhou, resolveu seguir carreira solo, apanhou, virou o maior ícone pop do planeta e passou a apanhar de si próprio e do mundo.




Mas, no fundo, entre todas as esquisitices que cercam a carreira e a vida dele, Michael Jackson sempre foi um menino extremamente talentoso. Um gênio precoce que pagou com corpo e a alma o preço de sua genialidade. E não se deu conta disso. Mas as especulações acerca do excêntrico e possivelmente criminoso Michael são muito menos interessantes do que seu legado musical. Este sim, bastante nutritivo."




Fonte: Afroências


Vá com Jah, Michael.


J.G.

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